sexta-feira, 4 de outubro de 2013

Palavras soltas

Como pediste Luana :p

Estava a chover lá fora. Água caía ruidosamente. As poças  acumulavam-se no chão. As gotas desciam pela janela de tal modo que parecia que estas próprias choravam. Era noite. Estava escuro na carruagem. Só se viam sombras exceto nos breves momentos em que as fortes descargas de energia desciam dos céus. Um fenómeno que só durava segundos, mas que a sua beleza e crueldade deixava qualquer um perplexo. Quem diria que a luz poderia ser tão poderosa? Tão terrível?

Luz. Sempre associada a coisas boas. Á inteligência, á visão, ao descobrir o desconhecido. Mas não. Atrás de cada luz há sempre uma sombra, embora atrás de algumas sombras haja luz.

Buuuuum,,, aquele som ensurdecedor arranca-me das divagações e volta a prender-me no mundo real. Encolho-me na manta que trago em cima do corpo.

Que sou eu no mundo? Como me posso comparar e incluir? Coisas tão lindas, fantásticas e ao mesmo tempo tão tenebrosas no exterior?... Não sei. Não sei o que sou... Não sou onde me encaixo. Sou o todo e o nada. São o relâmpago e o som. Sou o quê?

Encosto a minha cabeça ao banco e volto a olhar pela janela. Os bates das pingas de água na janela são um som único. Dou por mim a pensar no que deixei para trás. É um dia chuvoso. A água caí nos paralelos da casa dos meus avós na aldeia. Os cães vêm esfregar-se a mim a pedirem festas. No ar há um cheiro a carne e batatas assadas no forno, mas também algo mais. Sim, castanhas assadas.
Há um cheiro a terra molhada no ar. Olho para o lado, está lá o meu avô, Onde estamos? Sim, já me lembro. Estamos nos castanheiros. Está uma luz perfeita. Um caminho entre as árvores. O caminho para a luz. Ou para a sombra?

Ouro raio de luz... Nos breves instante que o exterior se ilumina, apercebo-me que estamos a atravessar um rio, por cima de uma ponte.

E se agora a ponte caísse? Ia alguém dar a minha falta? Ia o mundo deixar de funcionar? E a Terra parar de girar? Não... Sou o que no meio disto tudo. A diferença entre mim e uma formiga não é muita. Somos só mais um no meio duma multidão. Mais um no meio de muitos. Dispensável. Apenas uma gota no meio de muitas.

O som desta vez veio mais rápido e mais intenso. A trovoada está mais perto. Como sei isso? Podia dar uma palestra sobre velocidades da luz e do som, mas pra quê? Conhecimento acima de conhecimento. Onde é que isso nos leva? Sucesso? Auto concretização? 

A ponte não caiu. Parece que fica pra outros esse destino. Afasto-me cada vez mais do meu ponto de partida. Mas a tempestade ainda não parou. Não sei ao certo quando começou. 

Olho para o relógio. Quanto tempo faltará para chegar. Não sei ao certo também sou o único que ocupa esta carruagem. Encosto a cara à janela. Está fria. O vidro reflete a minha face. Olho para mim. O que vejo? Não vejo nada. Não me reconheço. A verdade é que nunca me cheguei a conhecer. Dizem que sou luz, mas eu só vejo escuridão. 

As gotas continuam a escorrer pala janela. Assim como as lágrimas escorrem pela minha cara. Tudo que fui, tudo que fiz, tudo que passei fez de mim algo negro como a noite lá fora. As lágrimas a chuva. O cabelo negro como a própria escuridão. Os olhos verdes luminosos como um relâmpago, mas escondendo as sombras das olheiras por baixo. Por fim, um personalidade tão obscura que espelha a noite por trás da janela.


Deito-me no banco. Olho para o teto, esperando que acabe esta longa viagem que é a minha vida.


2 comentários:

  1. Desculpa, não tenho vindo aqui muitas vezes... Mas adorei o texto, gosto imenso da maneira como escreves :)

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  2. Sobre: Tem uma carga emocional um pouco pesada mas adoro isso. É bom um texto fazer-nos sentir algo, mesmo que seja angustia ou tristeza. Não está tão como o do concurso, no sentido de ser banal. este tem um toque de reflexão, parece mais pessoal, no entanto a nível de vocabulário é menos rico. Pessoalmente, gostei de ambos mas este parece-se mais original e dá mais vontade de ler. Há alí acima uma gralha na pontuação, em vez de reticências são três virgulas, mas não sei se é assim mesmo se foi engano. Por mim podes continuar, é com gosto que leio o que escreves. :)

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